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domingo, 25 de abril de 2010

A PRESENÇA DA RELIGIOSIDADE E O FANATISMO EXAGERADO NA OBRA PEDRA BONITA DE JOSÉ LINS DO REGO

Raimunda kaciana de Jesus Gomes
RESUMO:
Este artigo tem por finalidade mostrar o Modernismo no Brasil, sua influência sobre muitos autores que os levou a iniciar um processo diferente e decisivo na história da Literatura brasileira e o modo como se pronunciaram, pois na obra Pedra Bonita de José Lins do Rego essa influência aparece nitidamente quando o autor explicita de forma crítica os acontecimentos da região Nordeste e as problemáticas.
Palavras - chave: Modernismo, Religiosidade, Fanatismo e Cangaço.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente trabalho apresenta a temática sobre a religiosidade, sua presença e predominância nas cidades interioranas e a influência que possui na mente de cada sertanejo, relatada na obra Pedra Bonita de José Lins do Rego, mostrando a trajetória dos personagens, a falta do pensamento crítico e as conseqüências causadas na vida dos fanáticos religiosos.

O MODERNISMO NO BRASIL-1922
CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL

O início do Modernismo no Brasil é assinalado pela Semana de Arte Moderna, ocorrida em São Paulo, em Fevereiro de 1922, resultando numa série de eventos que marcaram a vida cultural brasileira, com a presença de vários pintores, autores e escritores.

É a partir dessa data que a Literatura brasileira passa a ser encarada de uma maneira mais original, ou seja, chegava o fim daquele processo importado, onde a Literatura copiava as idéias, as criações de outros autores para serem expostas aqui no Brasil. Essa Literatura era inédita, diferente, pois com o movimento modernista, os autores brasileiros passam a mostrar a verdadeira identidade do Brasil, de sua pátria, através da pintura, de protesto nas poesias, a relação do Brasil e seu contexto social através dos romances. Todos estes aspectos são nitidamente visíveis quando percebemos a presença do homem do campo nas telas, a quebra do tradicional na prosa e poesia e as temáticas abordadas nos romances mostrando as dificuldades que o brasileiro enfrenta.

Vale ressaltar que o movimento modernista brasileiro passou por três fases distintas: a primeira de 1922 a 1930, conhecida como o período radical do Modernismo; a segunda de 1930 a 1945, apresentando as idéias literárias inovadoras e já consolidadas, sendo que também engloba o encerramento da ditadura de Getúlio Vargas e o fim da segunda guerra mundial.

Também é na segunda fase do Modernismo brasileiro que aparecem os nomes mais significativos do romance brasileiro com uma Literatura de caráter mais construtivo, de maturidade, aproveitando assim as conquistas da geração de 1922 que são: Érico Veríssimo, Jorge Amado, Rachel de Queiroz, Graciliano Ramos e o nosso objeto de estudo: José Lins do Rego.

Dessa forma, vemos a importância do regionalismo até então não alcançada na Literatura brasileira, levando ao extremo as relações do personagem com o meio natural, social, juntamente com a denúncia da realidade brasileira que exprime um grau de tensão nas relações do eu com o mundo.

JOSÉ LINS DO REGO: BIOGRAFIA

Para iniciar o estudo, assim se apresenta o autor José Lins do Rego (1901-1957). Tenho 46 anos, moreno, cabelos pretos, casado, com três filhos, 86 quilos, muita saúde e muito medo de morrer. (...) Se chove, tenho saudade do sol, e se faz calor, tenho saudades da chuva. Sou um homem de paixões violentas, temo os poderes de Deus, e fui devoto de Nossa Senhora da Conceição. Enfim literato da cabeça aos pés, sou capaz de tudo se me pisarem nos calos. Afinal de contas, sou um homem como outro qualquer e Deus queira que continue sendo.

Assim se apresenta o autor José Lins do Rego Cavalcanti, nascido em 3 de Junho de 1901, no Engenho Corredor, município de Pilar, Estado da Paraíba, que trazia consigo as raízes do sangue e da terra, que vinham de João do Rego Cavalcanti e Amélia do Rego Cavalcanti, seus pais, sempre ligados ao mundo rural do Nordeste açucareiro.

José Lins do Rego formou-se em Direito no Recife, época em que entrou em contato com Gilberto Freire e José Américo de Almeida. Esteve posteriormente em Alagoas, até que se fixou no Rio de Janeiro colaborando com jornais e escrevendo crônicas, o que posteriormente veio a estrear na literatura, em 1932, com a obra Menino de Engenho, e logo depois pelas obras de romances: Doidinho, Bangüê, Moleque Ricardo, Usina e Fogo Morto, sendo que com essas obras José Lins definia o “ciclo da cana de açúcar”. Já nas obras Cangaceiro e Pedra Bonita (objeto de estudo) o autor definia de “ciclo da seca e do cangaço”, pois relata nesses romances o misticismo, a religiosidade e o fanatismo do povo.

Dessa maneira, o regionalismo de José Lins do Rego aparece por excelência, procurando manter a relação com a terra de origem, porém sem perder a atitude. E com isso percebemos nitidamente que a obra abrange justamente os depoimentos humanos, e ao mesmo tempo, um depoimento social, quando narra a ascensão e o declínio dos engenhos e todas as consequências que sofreu a região e seus habitantes com a ilusão de uma vida melhor, se comparada a vida que tinham em relação aos senhores de engenho, pelo modo que trabalhavam, que eram tratados e como viviam.

Em 1955, abriu-lhe as portas a Academia Brasileira de Letras elegendo José Lins do Rego para a cadeira de n 25, substituindo Ataulfo de Paiva, e recebendo oficialmente a 15 de Dezembro do ano seguinte, após seu regresso da Europa, já então com a saúde abalada. Saudou-se o acadêmico Austregésilo de Athayde, e nove meses depois, a 12 de Setembro de 1957, no Rio de Janeiro, José Lins do Rego Cavalcanti fez sua viagem final, a viagem para o mundo desconhecido, porém ele mal completara os 56 anos de idade.

Entretanto a obra, que deixou na área do romance, deu-lhe consagrações e muita importância literária, onde atualmente muitos críticos se deleitam ao estudarem a obra de José Lins do Rego, que o diga Otto Maria Carpeaux, sendo um deles, ao definir a obra de José Lins :

"A obra de José Lins é mais, muito mais que um documento sociológico; é qualquer coisa de vivo, porque o seu criador deu-lhe o próprio sangue, encheu de gracejos e tristezas, risos e lágrimas e da sua grande sabedoria literária deu-lhe o hálito da vida. Essa obra não morre tão cedo, é eternamente jovem como o povo, é triste como o povo.É o trovador trágico da província".
(Otto, Rio,Outubro de 1960).
José Lins do Rego é um renomado não só pela grandiosidade de sua obra, mas pela sabedoria literária com que encanta os apreciadores de sua obra.

CARACTERÍSTICAS DE JOSÉ LINS DO REGO

· Dedicou-se à fixação da paisagem física e humana do Nordeste.
· Ficou célebre com os romances do ciclo da cana de açúcar que se compõem de Menino de Engenho, Doidinho e Fogo Morto.
· Transportou para os romances as impressões que ficaram em sua memória, ligados a transformações que abalaram a região, e relatos que ouviu dos parentes ainda menino.
· Apresentou o mandonismo dos coronéis, o conflito dos patriarcas com os bacharéis, juntamente com a luta do progresso da industrialização contra o atraso da região.
· Debateu sobre o fanatismo popular e as tropelias dos bandoleiros, a fazer justiça com as próprias mãos sendo truculentos e brutais.

INTRODUÇAO À TEMÁTICA LITERÁRIA

A PRESENÇA DA RELIGIOSIDADE E O FANATISMO RELIGIOSO EXAGERADO NA OBRA PEDRA BONITA DE JOSÉ LINS DO REGO

A obra Pedra Bonita de José Lins do Rego Cavalcanti apresenta a história da tragédia pernambucana de 1836, onde morreram várias pessoas, para que com o sangue derramado fossem lavadas as duas torres da catedral do reino de D. Sebastião, reino esse que era encantado pela existência das duas pedras.

É a partir desse fato histórico que o autor vai relacionar a história da narrativa, que abrange como temática predominante o contexto sócio-político e religioso da região nordeste, como é definida pelo autor como sendo uma das mais castigadas, onde na primeira parte da obra o autor foca o personagem principal Antonio Bento. Este é o típico sertanejo religioso que teme a Deus, coloca os dogmas da igreja em primeiro lugar e sempre é acompanhado pelo padre Amâncio, que é a representação fiel da religião. Dessa forma a religiosidade aparece como marca principal do sertanejo interiorano.

"Mesmo assim na missa das onze a igreja ficava vazia.Só as mulheres acudiam ao chamado. Os homens do Açu não se importavam com devoção. Todas as mulheres do Açu deixavam as casas sujas e iam escutar o evangelho do padre Amâncio. E pediam pelos seus filhos e maridos.Depois Deus era escondido no sacrário".
(Pedra Bonita, p.25)

Verificamos aqui que a religião é a base principal, o suporte que aparece quando o autor compara o padre aos santos, que tanto se percebe na narrativa.Assim é relevante explicitar que geralmente no interior as pessoas mais humildes se deixam levar por idéias equivocadas, por serem ingênuas e generosas e muitas vezes por falta de conhecimento até. É notável também a comparação da figura do padre com padre Cícero, figura essa que é tida no inconsciente do povo nordestino como um homem santo, justificando a disparidade religiosa e direcionando-se para o lado do fanatismo religioso com drásticas consequências.

À medida que analisamos a obra, pensamos que atualíssima devido à metalinguagem, onde o autor não se limita somente a mesma, percebemos nas entrelinhas a construção da região Nordeste servindo de cenário para heróis, cangaceiros, santos, fanáticos e místicos que o autor relaciona a fatos históricos, por exemplo, os homens fanáticos que resolvem acompanhar o beato vindo da Bahia tem uma esperança, que é a de tornar o mundo mais verdadeiro e com mais igualdade. Nessa ótica José Lins faz menção ao sebastianismo messiânico que se agregou no sertão nordestino, onde o rei de Portugal D. Sebastião corria o risco de perder o trono, porém com o nascimento de D. João o problema foi resolvido. Mais tarde D. Sebastião morre, e sendo ele um religioso e apaixonado, conta a lenda que em meio ao caos da batalha, os céus se abriram e os anjos levaram D. Sebastião, donde ele haveria de voltar em forma humana, porém já sendo um deus para purificar o mundo com seu espírito de fartura e justiça.

Segundo Facó (1983, p.55), "o fanático é o pobre submisso que acompanhava os beatos devido a sua ignorância completa do mundo exterior do sertão”. E esse é o enfoque que José Lins mostra através de Pedra Bonita, explicitando também que o analfabetismo generalizado chega a ser a única consciência das pessoas, e consequentemente consciência de mundo, da natureza e da sociedade onde as populações interioranas eram caracterizadas pela religião ou por seitas nas próprias comunidades rurais.

Daí, vemos a gravidade do fanatismo religioso como um caso a ser pensado, pois naquela época num ambiente cheio de analfabetos, de fome e de pressão psicológica, percebemos que o povo com fome é capaz de tudo, chegando ao ponto da sensibilidade aflorar-se, causando assim momentos propícios para visões e sacrifícios em nome de Deus, como podemos perceber ao longo da obra Pedra Bonita.

"Mas o filho queria o sangue dos inocentes para o grande milagre. O sangue dos que não tivessem sujos de pecado.O sangue dos meninos e das donzelas para o grande milagre, e assim as donzelas teriam que dar a virgindade para que a força do filho entrasse de madre a dentro e secasse as porcarias do mundo".(Pedra Bonita, p.140).

A grosso modo notamos a ignorância de muitos sertanejos, pois é evidente que o povo sempre almeja um mundo de esperança, de igualdade, de prosperidade e para que isso se realize acreditam na chegada de um messias. Entretanto esse messias tão esperado e idealizado é que faz com que as pessoas passem a acreditar em superstições, na vinda de um redentor que vai redimir os homens, quando na verdade, quem tem de se redimir são as próprias pessoas desse pensamento equivocado para que possam enxergar o mundo de uma ótica diferente, ou seja, evoluir de pensamento procurando melhorar o convívio com as pessoas e com o próprio mundo.

A questão do fanatismo religioso exagerado é preocupante, pois como vemos ainda causa atrozes consequências, tanto naquela época e atualmente também, pois ainda presenciamos muitas aparições de fanáticos religiosos em homens bombas e que não medem esforços para estragar a vida de inocentes, como por exemplo, percebemos o caso do missionário norte-americano Jim Jones, que em 1978 levou 900 seguidores seus ao suicídio na Guiana Francesa, numa pequena comunidade.Já em 1933, nos Estados Unidos, David Karesh, que se intitulava a reencarnação de Jesus, promoveu um verdadeiro inferno no rancho de madeira, onde ficava a seita Branch.David, seduzindo os seguidores com a filosofia de que deveriam morrer para depois ressurgir das cinzas, daí ele derramou combustível no rancho e ateou fogo, matando 80 pessoas, incluindo 18 crianças.E com isso é fácil notarmos que todos esses exemplos são manifestações de populações carentes, de insatisfação social das pessoas que tiveram um desfecho trágico.

Infelizmente sentimos as consequências do fanatismo religioso atualmente, e essas idéias lamentavelmente não param de acontecer, justamente pelo fato das pessoas não terem senso crítico, serem desinformados e o pior, não buscarem a compreensão da evolução da igreja, porém se os fanáticos parassem de acreditar nesses equívocos, certamente que se evitariam desgraças.
Outra temática presente na obra é o cangaço, relacionada ao fanatismo definindo como cangaceiro os participantes de bandos que pegam armas para viver de assaltos. E no sertão, tornar-se cangaceiro era questão de status e vinha de uma conseqüência geralmente cometida através de um crime, desobediência às leis, ou muitas vezes vingar a morte de um ente querido.

"A vida no grupo é ruim continuava Aparício. A gente come fogo. Tu não sabe o que é passar 15 dias por aqui. E até já pensei em me entregar, mas se for pra morrer, eu morro no cangaço.A vida é danada Domício, mas a gente agüenta.Outro dia nós demo um fogo pra lá da Vila Bela".
(Pedra Bonita, p.156).

Dessa forma percebemos que os cangaceiros assumiam a posição de justiceiros, em oposição ao Estado, porém também faziam crueldades com as famílias, as donzelas, o que não era diferente também das forças do Estado.

Assim os fazendeiros, coronéis e o povo em geral ficavam como marionetes, sendo dominados ora por cangaceiros, ora pelos militares, sofrendo violências absurdas de ambas as partes, procurando assim um vingar o outro através da população.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na relação do contexto histórico com a obra Pedra Bonita, José Lins do Rego faz um paralelamento da religiosidade e do fanatismo religioso, ao explicitar na obra a história de D. Sebastião dita por João Antonio, que em 1836 estava encantado nas duas pedras, e para libertá-lo João Ferreira, o seu cunhado teria que realizar o grande milagre pois fora destinado a essa missão.

José Lins do Rego cita na obra Pedra Bonita como o santo consegui derramar o sangue das crianças, degolar as mães arrependidas e usar de todas as virgens a fim de realizar o milagre com sangue pecador, fazendo assim uma crítica aberta ao fanatismo religioso, as pessoas, ao pensamento sem evolução, mostrando que o misticismo ainda é bem incompreendido, e muitos o interpretam em sua forma mais lúgubre, pois na verdade Ferreira era um fanático e maníaco sexual, onde as virgens tinham de passar a noite com ele antes do casamento.

Ele foi preso época Poe essas mazelas e por ser polígamo, pois era casado com sete mulheres e por isso julgava-se santo alimentando o delírio místico, que teve seu ápice quando ele proclamou que a pedra só se desencantaria quando fosse lavada com sangue, o sangue dos mortais, para depois se tornarem imortais.

Infelizmente vemos as consequências do fanatismo que perdura ainda porque as pessoas não têm, ou não querem aceitar uma visão mais realista, iludindo-se apenas com a fantasia, onde o mundo só é perfeito através da ilusão, do idealismo, da mentira, e tudo isso a custe de muito sangue derramado e muita vida destruída.


BIBLIOGRAFIA

FACÓ, Rui. Fanatismo e Cangaço. 19 ed. São Paulo:Moderna, 1983.

REGO, José Lins do.Pedra Bonita.Rio de Janeiro:Editora três, 1973.

TUFANO, Douglas.Estudos de Língua e Literatura.4 ed.São Paulo: Moderna, 1990

A FIGURA DO ANTAGONISTA EM O CORTIÇO DE ALUÍSIO AZEVEDO


Raimunda Kaciana de Jesus Gomes

RESUMO:

Este artigo tem por finalidade mostrar o Realismo e o Naturalismo na perspectiva de traçar um panorama histórico do Brasil apresentando a modernidade e a grande revolução do pensamento, por meio da comparação com o perfil e o estilo do escritor Aluísio Azevedo, em O Cortiço, autor considerado o maior expoente brasileiro do Naturalismo.

Palavras-chave: Realismo. Naturalismo. Exploração do homem. Interferência do meio e problemas sócio-econômicos.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente trabalho apresenta a temática da sociedade e a forma como vê o homem como ser racional, animal pensante e lógico, ao mesmo tempo condicionado ao trabalho com a intenção de gerar lucros, como apresenta a figura de João Romão em O Cortiço, mostrando a trajetória que os personagens percorrem na obra, com efeitos, o produto daquele meio será exatamente igual a ele.

O REALISMO E O NATURALISMO NO BRASIL
Iniciados oficialmente em 1881 com a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, que consta o marco do surgimento do Realismo, e O Mulato, de Aluísio Azevedo, que consta o marco do surgimento do naturalismo, e enfraquecidos por volta de 1890, quando floresce o Parnasianismo, O advento do Realismo e do Naturalismo em nosso país ocorre numa data que se tornou simbólica para a Literatura Brasileira, pois foi nítida a mudança dos estilos em que os autores apareciam com mais liberdade sempre procurando a verdade, e não mais ocupar as exigências sentimentais.
A partir daqui podemos perceber que enquanto alguns autores selariam nossa independência literária, Aluísio Azevedo tornaria-se o líder da presença do estilo naturalista entre nós, pois entendia o cientificismo que é a ciência como único conhecimento, substituindo assim a visão subjetiva reinante nos romances românticos para uma visão totalmente objetiva onde a preocupação de relatar questões polêmicas. E é isso que o autor mostra ao explorar o preconceito, o adultério, a escravidão, as agruras do cotidiano como pobreza, prostituição e principalmente a exploração do homem deixando bastante claro que o mundo pertence aos mais espertos na figura de João Romão.

O PERÍODO LITERÁRIO
No Brasil, o período realista-naturalista ocorreu entre 1881 a 1902, e esse período foi marcado pelas teorias científicas que aparecem na obra literária O CORTIÇO, que são o determinismo de Taine, o positivismo de Comte e o evolucionismo de Darwin.
O determinismo segundo Taine, tudo, inclusive a arte, é produto do meio. Para ele o agir humano é determinado por variáveis biológicas, ou seja, todas as suas vontades e ações não são livres, no sentido de uma determinação racional e espontânea do sujeito, e sim resultado de mecanismos biológicos. A narrativa mostra que a teoria de Taine é predominante porque mostra que, a maior parte das pessoas está acostumada e acomodada em sua situação e acreditam que aquela vida um tanto “lamentável” é o destino de cada um deles. Assim de acordo com a teoria, quem nasceu pobre vai morrer pobre, empregado jamais será patrão, filha de prostituta será prostituta. Teoria um tanto quanto radical que encontramos presente em praticamente todos os momentos da obra O CORTIÇO.
No positivismo, Comte prega a transformação da sociedade através de normas necessárias para reforma-lá, conduzindo-a a uma etapa positiva. É preciso fazer uma observação, experiência e comparação para amenizar os problemas da sociedade.Sendo assim, a educação e a estrutura familiar seriam fundamentais para o êxito dessa teoria. Na obra O cortiço notamos características positivistas, como por exemplo, a preocupação de jerônimo em manter sua filha em um colégio, no intuito que ela tivesse melhores chances de vida.
O Evolucionismo destaca, entre outras coisas, a permanente concorrência entre os indivíduos com base na transformação social. Como exemplo disso podemos citar a concorrência desenfreada entre João Romão e Miranda, a inveja que um sentia do outro: “ tornou-se uma luta renhida e suada entre o português negociante de fazenda por atacado e o português de secos e molhados” ( O Cortiço, p. 22) .
A FIGURA DO ANTAGONISTA
De acordo com a definição de Coutinho ( 1987, p.752), entendemos que antagonista: é o que responde ao protagonista, isto é, desafia-o, opõe-se a ele e a seu destino.É o vilão da história, podendo ser pessoa ou força interna ou externa, cita-se as potências da natureza (tempestades, mar etc.), os fatores ambientais ( influências de ambientes sociais degradantes ou vice e versa, educação, etc). Quanto as forças internas, consideram-se virtudes ou defeitos.
Em O Cortiço, expressão máxima do Naturalismo brasileiro, apresenta como um dos personagens principais João Romão, um português que pode ser encarado como metáfora do capitalismo selvagem, pois tem como principal objetivo na vida enriquecer a qualquer custo. Ambicioso ao extremo, não mede esforços sacrificando até a si mesmo. Veste-se mal, dorme no mesmo balcão em que trabalha. Das verduras de sua horta, come os piores, o resto vende: “ O português nunca ia a passeio, nem ia a missa aos domingos; tudo o que rendia a sua venda e mais quitanda seguia direitinha para a caixa econômica e daí para o banco”. ( O cortiço. P.8)
Mas sua ascensão não vai se basear apenas na auto-flagelação. Explora descaradamente os moradores do cortiço onde mora os seus próprios vizinhos. O vinho que João Romão vende aos seus clientes é diluído em água, essa passagem mostra que o brasileiro está destinado a ser explorado pelo estrangeiro, mas o mais sintomático do seu caráter está na sua relação com Bertoleza. Essa era uma escrava que ganhava a vida vendendo peixe frio diante da venda de João Romão, eles tornaram-se amantes, pois ela se viu só e ele, ao apoia-la, aproveita as economias dela e, mentindo, confessa que havia comprado a sua carta de alforria.
No entanto, ele investe em seus próprios negócios, construindo três casinhas, imediatamente alugadas: nesse dia ele saiu muito a rua, e uma semana depois apareceu com a folha de papel toda escrita, que leu em voz alta a companheira. Era a carta de alforria da crioula. Contra todo o costume abriu-se nesse dia uma garrafa de vinho do porto e os dois beberam-na em honra ao acontecimento. (O Cortiço, p.8). Com o passar do tempo, de três casinhas chegam a ser 99, percebe-se que o progresso é resultado não só do tempo, mas também do dinheiro que vai sendo investido, numa postura claramente capitalista e do furto que João Romão e sua amante vão realizando do material da construção dos vizinhos, tornando-se assim o cortiço São Romão.
Percebemos que na obra O Cortiço Aluísio Azevedo descreve a origem e o estágio da narrativa com minuciosidade do Naturalismo dentro de dois aspectos: o primeiro são as condições do meio, água a vontade, permitiram que a moradia coletiva se desenvolvesse. Vemos nesse tópico a influência das crianças que a biologia estava tendo na época. Quanto ao segundo aspecto, a maneira como são descritos os moradores em sua agitação, semelhantes a larvas minhocando, num monte de esterco, comparando os personagens a animais, num processo conhecido como zoomorfismo, personificando o cortiço, que vai nascer, tendo como pai João Romão. Os personagens vão ser tratados como conseqüência, não como causa, são efeito do cortiço que vai determinar seu comportamento.
O personagem de João Romão sintetiza a própria visão naturalista, pois fica claro que o autor faz à sociedade e os caráteres individuais através desse personagem, onde eles tendem a se simplificar, pois são vistos como joguetes biológicos e sociais que determinam suas ações e sentimentos. São tipos humanos que encaram os vícios, as patologias, as ambições, que mostram o homem descendo a condição animalesca em situação de mero produto das circunstâncias externas, como a hereditariedade e o meio ambiente: “ E João Romão , estalando de raiva viu que aquela nova república de miséria prometia ir adiante e ameaçava fazer-lhe a sua, perigosa concorrência. pôs logo em campo, disposto a luta e começou a perseguir o rival por todos os modos”. ( O Cortiço, p. 44).
O fundamento do Naturalismo propõe a substituição do “estudo do homem abstrato e metafísico pelo do homem natural, sujeito a leis do meio físico-químico e determinado pela influência do meio. A partir dessa colocação podemos considerar o Naturalismo, como um estilo que consiste no exagero, exacerbação da tendência racionalista, com a proposta básica de compromissos com a verdade objetiva das mazelas que denuncia.
Aluísio Azevedo elabora os personagens de acordo com a visão que tem de explicar o real de uma forma mais ampla de qualquer outro meio. Demonstra isso através de João Romão que já estando rico o bastante aparece com outros planos: quer subir o nível de seus moradores, é um reflexo de seu desejo ao mesmo tempo em que sonha com aceitação social. Para tanto, além de ativar uma vida social, sonha em se casar com a filha de seu vizinho, Zulmira, daí vemos um jogo de interesses político-sociais e econômicos.
Ah! Que revolução não se feriu no espírito do vendeiro! Passou dias a estudar aquela visita, ensaiou o que tinha de dizer, conversando sozinhoo defronte do espelho; afinal no dia marcado, banhou-se em várias águas, vestiu-se de roupa nova e apresentou-se cheio de timidez no espelhado e pretensioso salão. (O Cortiço, p.46).
Ainda percebemos que o personagem naturalista é desprovido de livre arbítrio e entendido como fato natural. Não age motivado pela vontade, mas é determinado, causado por forças internas ou externas (ambiente social) que o submetem, acompanhado por instinto e baseados em interesses financeiros, no desejo da ascenção social desvelando qualquer condição humana, onde cada fato é a perpetuação de um passo anterior na dança social, onde o ontem sobrevive ao hoje porque é uma conseqüência.
Isso fica claro na hora em que João Romão ao se deparar com o velho Botelho, ex-empregado, morando na casa de Miranda, tentando salvar suas economias acaba atacando seu inquilino para furta-lo: João Romão meteu-se na sua toca para esconder o furto. Ao primeiro exame, reconheceu-se logo que era dinheiro em papel, o que havia nas grandes garrafas. Enterrou a trouxa na prateleira de um armário velho e cheio de frascos e voltou lá para acompanhar o serviço dos bombeiros. (O Cortiço, p.57)João Romão não pregava os olhos ao pensar no que fazer para dar um fim na crioula Bertoleza, e sendo aquele desespero no cortiço, Botelho foi falar a João logo cedo. A crioula ao ouvi-los reclamou seus direitos, João se irritara, tivera uma idéia de manda-la embora, vemos aqui claramente a exploração e a ingratidão do homem.
Na obra O Cortiço percebemos o caráter de cada personagem, suas ações, conseqüência de seus instintos. Notamos também esse aspecto ao analisarmos as personagens como, por exemplo, Rita Baiana acabou com o casamento de Piedade e Jerônimo, nessa parte percebemos o antagonismo presente como também em Miranda que tem uma realidade com João Romão. O velho Botelho apesar de ser idoso e parecer sensível , também notamos o antagonismo nesse personagem quando deixa claro que pedia dinheiro aos vizinhos, se fingindo de pobre e ao final descobre-se que ele tinha muito dinheiro guardado e mentia.
Nesse personagem encontramos a origem dos problemas que enfrentamos hoje, como hipocrisia e impunidade ao ser agraciado com o título de membro honorário dos abolicionistas quando na verdade enganou a sua amante Bertoleza. E o ponto chave do verdadeiro caráter do antagonista, a figura do anti-herói como um animal condicionado ao trabalho e incapaz de assimilar inteligência capitalista para a geração de lucros. É esse aspecto que a Literatura Naturalista procura demonstrar, que o ser humano não é livre , ele é condicionado e determinado pelo meio em que vive.
Podemos perceber que o Naturalismo enfatizava bastante o aspecto materialista da existência humana passando a ser uma análise mais profunda do realismo, onde essa nova escola baseava-se bastante na observação da realidade e o romance naturalista acentua esse aspecto ao mostrar o distanciamento do escritor em relação à sociedade romântica, e pós romântica colocando em vista os conceitos do Realismo e do Naturalismo. Assim, fica claro a observação empírica e não a idealização da realidade que caracterizou o Romantismo. Realismo e Naturalismo não são sinônimos, entretanto muitos teóricos afirmam que são duas faces da moeda.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na obra “O Cortiço”, percebemos as idéias modernas da Europa que enfatizam os problemas econômicos, políticos, mostrando os seres, sendo comparados a animais, sob a influência do meio. Através desta literatura, vemos o reflexo do meio o qual ela está inserida, surgindo o realismo-naturalismo, em que personagens e enredos aceitam o destino das leis naturais. Nisso, a literatura realista é, uma literatura triste, já que mostra os defeitos de uma sociedade juntamente com a estrutura moral das personagens. Como afirma Bosi “ O realismo se manifesta em prosa ao propor um olhar mais objetivo da realidade, por parte do escritor que se tingirá de naturalismo sempre que fizer personagens e enredos submeterem-se ao destino cego das leis naturais” (2006, p.168).

BIBLIOGRAFIA

BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. 43 ed. São Paulo: Cultrix, 2006.

COUTINHO, Afrânio. A Literatura no Brasil. 6ª ed. São Paulo: Global, 2002.

MOISÉS, Massaud. A Literatura Brasileira.através dos textos. 18 ed. São Paulo, Cultrix, 1994.
TUFANO, Douglas. Estudos de língua e Literatura. 4ªed. São Paulo: Moderna,